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A Utilização do Crédito de Aluguel como Caução em Liminar de Despejo
05/09/2025



A utilização do crédito de aluguéis a título de caução, em pedido liminar de Ação de Despejo, tem sido admitida pelos Tribunais Superiores, especialmente no Estado de São Paulo.
A finalidade da caução, em pedido liminar de despejo, quando o contrato está desprovido, ou extinta as garantias, é assegurar a reparação dos danos decorrentes de eventual revogação da liminar, garantindo o exato restabelecimento do estado anterior da coisa ou, ao menos a indenização pelos danos causados. Usualmente, a fim de garantir o juízo, realiza-se o depósito de três vezes o valor vigente do aluguel à época do pedido. Mas, os Tribunais Superiores, especialmente no Estado de São Paulo, têm admitido o crédito de aluguéis a título de caução.
A locação de imóveis, regulamentada pela Lei nº 8.245/1001 (“Lei do Inquilinato”), estabelece um conjunto de direitos e deveres para locadores e locatários, buscando equilibrar os interesses inerentes a essa modalidade contratual. Contudo, nem sempre as relações transcorrem harmoniosamente, e o inadimplemento ou a violação de outras cláusulas contratuais ou legais pode levar à necessidade de retomada do imóvel pelo locador, culminando na propositura de uma ação de despejo.
A ação de despejo, por sua natureza, tem por objetivo a posse direta de um imóvel que se encontra sob locação, ou seja, a retomada do bem, constituindo um dos instrumentos jurídicos mais importantes à disposição do proprietário.
No entanto, o tempo de tramitação de um processo judicial pode ser considerável, frustrando a expectativa do locador, que vê seu imóvel ocupado sem a devida contraprestação ou em desconformidade com o contrato. É nesse contexto que os pedidos liminares se tornam relevantes, permitindo que o Poder Judiciário conceda, em caráter antecipado, a desocupação do imóvel antes do julgamento final da lide, mitigando os prejuízos e a protelação indevida.
O direito brasileiro prevê diversas hipóteses em que o locador pode ajuizar uma ação de despejo, cada uma com suas peculiaridades e requisitos. Entre as causas mais comuns, destacam-se:
(i) Falta de pagamento de aluguéis e encargos;
(ii) Infrações contratuais ou legais:
(iii) Término do prazo da locação;
(iv) Necessidade de retomada para uso próprio, de descendente ou ascendente;
(v) Realização de obras ou reformas.
A liminar de despejo encontra previsão legal no artigo 59, §1º, da Lei nº 8.245/91, que autoriza o juiz a concedê-la inaudita altera pars (sem a oitiva prévia do réu), permitindo a desocupação do imóvel em quinze dias, independentemente da audiência da parte contrária, e desde que haja a prestação de caução no valor equivalente a três meses de aluguel vigente à época do pedido.
Essa medida de urgência é uma exceção à regra geral do contraditório, justificada pela iminência de prejuízos graves ao locador e pela presunção de verossimilhança de seu direito em certas situações taxativamente elencadas pela lei.
As hipóteses para a concessão da liminar de despejo são específicas, tais como o término do prazo do contrato de locação; falta de pagamento de aluguel e acessórios da locação no vencimento; descumprimento do mútuo acordo; existência de sublocatário sem a prévia autorização do locador etc.
A caução, no âmbito do direito processual civil, é uma garantia que uma das partes presta em juízo para assegurar o cumprimento de uma obrigação ou para ressarcir eventuais prejuízos que a outra parte possa vir a sofrer em decorrência de uma decisão judicial provisória.
Sua natureza jurídica é a de uma garantia real (recai em bem móvel ou imóvel) ou fidejussória (pessoal), de caráter instrumental, que tem por finalidade proteger o interesse da parte que pode ser prejudicada pela execução de uma medida judicial.
A finalidade protetiva da caução é, primordialmente, indenizar o litigante que eventualmente venha a ser prejudicado pela ineficácia ou pela revogação de uma decisão judicial precária. Em outros termos, a caução atua como uma contracautela, equilibrando os riscos inerentes à concessão de tutelas de urgência, que por sua própria natureza são proferidas em um ambiente de cognição sumária e podem, posteriormente, ser modificadas ou anuladas.
Assim, a parte que obtém uma medida de urgência e, em razão dela, causa danos à parte contrária, terá a caução como fonte para o ressarcimento desses prejuízos.
Especificamente na Lei do Inquilinato, a caução para a concessão da liminar de despejo está expressamente prevista no artigo 59, §1º, que estabelece o valor equivalente a três meses de aluguel. Ocorre que, a lei não traz rol taxativo às formas pelas quais a caução pode ser prestada, sendo a usualmente utilizada a caução em dinheiro.
Considerando que em uma ação de despejo, quando há pedido liminar de despejo, o desembolso de três aluguéis a fim de caucionar o juízo e, então, prosseguir com o despejo onera ainda a situação do proprietário que já suporta prejuízos anteriores ao ajuizamento da ação.
Além disso, como dito, a Lei do Inquilinato não detalha exaustivamente as formas de caução a ser prestada para o deferimento do pedido liminar de despejo.
Pois são a partir de tais fundamentos que os Tribunais Superiores¹ têm admitido o oferecimento do crédito do aluguel em substituição à caução em dinheiro. Para tanto, necessária a existência de um crédito de aluguéis de valor superior ao montante exigido a título de caução.
As implicações práticas da eventual consolidação dessa prática são significativas. Para o locatário, representaria uma importante desoneração e um avanço na equidade processual. Para o locador, embora possa gerar um potencial inicial de litigiosidade na discussão sobre o crédito, eliminaria a necessidade de gerenciar depósitos e, em última análise, não traria prejuízo se o crédito for, de fato, existente e válido. Para o sistema judiciário, a medida contribuiria para aprimorar a capacidade de adaptação do direito às complexidades das relações sociais, promovendo soluções mais justas e eficientes.
O suporte jurídico é essencial para pleitear o direito de retomada do imóvel, tornando-se, inclusive dever do advogado resguardar o proprietário, caso este seja seu cliente, considerando os prejuízos por ele já suportados e que antecedem a propositura da Ação de Despejo.
¹LOCAÇÃO DE IMÓVEL. AÇÃO DE DESPEJO CUMULADA COM COBRANÇA DE ALUGUÉIS. DEFERIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA. OFERECIMENTO DO PRÓPRIO CRÉDITO OBJETO DA LOCAÇÃO COMO CAUÇÃO . ADMISSIBILIDADE. AGRAVO PROVIDO. A efetivação da medida liminar, em ação de despejo, depende da prévia prestação de caução, nos termos do artigo 59, § 1º, da Lei 8.245/91 . A caução pode ser real ou fidejussória e, no caso, nada impede que o próprio crédito objeto da locação seja dado em garantia. (TJ-SP – Agravo de Instrumento: 22743839120248260000 Barueri, Relator.: Antonio Rigolin, Data de Julgamento: 25/09/2024, 31ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/09/2024)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEI DO INQUILINATO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA . CONTRATO DE LOCAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO. LIMINAR. CAUÇÃO . CRÉDITOS DOS ALUGUÉIS. SUBSTITUIÇÃO. POSSIBILIDADE. NOTIFICAÇÃO PREMONITÓRIA . PRESCINDIBILIDADE. LIMINAR MANTIDA. 1 – Gratuidade de justiça. Pedido formulado no recurso . A declaração do agravante de que não tem condições de arcar com as despesas do processo, sem prejuízo de seu próprio sustento e de sua família, está em conformidade com as condições de vida demonstradas no processo (art. 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal e o art. 99, § 2º, do CPC/15). Benefício deferido . 2 – Liminar de despejo. Caução. Crédito dos aluguéis. É possível ofertar, como caução da liminar de despejo de que trata o art . 59, § 1º, da Lei de Locações (8.245/91), o crédito dos aluguéis vencidos e não pagos, resguardando-se ao locatário a possibilidade de demonstrar a quitação no prazo concedido para eventual revogação da medida de urgência concedida. 3 – Compensação. O acordo de compensação de aluguéis, em tese, tem eficácia jurídica . Contudo, no caso em exame o locador negou a existência do referido negócio, o qual é desprovimento de qualquer elemento probatório. Ademais, o agravante não indica o valor gasto na reforma alegada, o que impede cogitar-se de compensação ante a falta de obrigações líquidas e vencidas (art. 369 do Código Civil). Não é caso de legitimar retenção por benfeitorias com base na Lei de regência (8 .245/91). 4 – Despejo. Atraso de aluguéis. Notificação prévia . Prescindibilidade. No que tange à ausência de notificação premonitória, a propositura de ação de despejo por falta de pagamento de aluguéis e acessórios da locação prescinde da notificação prévia do locatário, presente o disposto nos artigos 56 e 57 da Lei 8.245/1991 (Acórdão 1839573, Relator (a): JAMES EDUARDO OLIVEIRA, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 21/3/2024). 5 – Recurso conhecido, em parte, e nesta desprovido. (ic) (TJ-DF 07185587020248070000 1905149, Relator.: AISTON HENRIQUE DE SOUSA, Data de Julgamento: 08/08/2024, 4ª Turma Cível, Data de Publicação: 22/08/2024)
Jéssica Camila Montagner
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