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O Tratamento do Crédito de Honorários na Recuperação Judicial: Análise à Luz Do Tema Repetitivo 1051 do STJ
30/10/2025
Entendimento do STJ consolida critério objetivo para a definição dos créditos sujeitos à recuperação judicial, oferecendo maior segurança às empresas em reestruturação.
O debate acerca do tratamento dos créditos de honorários advocatícios no âmbito da recuperação judicial ganha relevo diante do Tema Repetitivo 1051 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que fixou importante marco interpretativo sobre o momento de existência do crédito para fins de sujeição aos efeitos da recuperação. A questão é especialmente sensível para as empresas em crise, pois define quais débitos — inclusive honorários advocatícios — devem integrar o quadro geral de credores e quais permanecem excluídos, com repercussão direta na viabilidade do plano e na segurança jurídica do processo recuperacional, uma vez que tais créditos costumam ter quantias elevadas.
No julgamento dos Recursos Especiais nº 1.843.332/RS, 1.842.911/RS, 1.843.382/RS, 1.840.812/RS e 1.840.531/RS, sob a relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a Segunda Seção do STJ fixou a seguinte tese:
“Para o fim de submissão aos efeitos da recuperação judicial, considera-se que a existência do crédito é determinada pela data em que ocorreu o seu fato gerador.”
Em outras palavras, o crédito deve ser considerado existente a partir do momento em que nasce a obrigação jurídica que o origina, o que pode ser a sentença ou o acórdão, e não o respectivo trânsito em julgado da decisão que o reconhece. Assim, mesmo que o momento processual que concretiza o direito de cobrança do crédito relativo aos honorários sucumbenciais – trânsito em julgado – se dê posteriormente, o fato gerador a ser considerado para fins de sujeição ao processo de recuperação judicial, é a decisão judicial que o fixou; e ainda, se se tratar de honorários contratuais, o que deverá ser considerado é o momento da prestação do serviço profissional, ou seja, se ocorreu antes do pedido de recuperação judicial, o crédito deverá ser submetido ao respectivo processo.

Na prática, essa orientação tem relevante impacto sobre os honorários advocatícios sucumbenciais e contratuais. Por exemplo, quando a empresa recuperanda é parte vencida em demanda judicial cujo mérito foi julgado antes do pedido de recuperação, ainda que o trânsito em julgado tenha ocorrido depois, o crédito de honorários do advogado da parte contrária será considerado concursal — devendo ser habilitado e pago conforme as regras do plano aprovado. Da mesma forma, honorários contratuais decorrentes de serviços prestados antes do ajuizamento da recuperação também integram o passivo sujeito à recuperação. Essa interpretação evita distorções que poderiam privilegiar determinados credores em detrimento da paridade entre os credores, princípio basilar do instituto.
Por outro lado, créditos oriundos de honorários advocatícios gerados após o pedido de recuperação — como aqueles decorrentes de novas ações ou de serviços contratados pela própria recuperanda para a condução do processo judicial — possuem natureza extraconcursal, não se submetendo ao plano de soerguimento. Nesse cenário, o crédito de honorários atua como despesa essencial à continuidade da atividade empresarial, devendo ser satisfeito com prioridade, conforme o art. 67 da Lei nº 11.101/2005. Essa distinção prática entre créditos concursais e extraconcursais é fundamental para preservar tanto a higidez financeira da recuperanda quanto a boa-fé dos profissionais que continuam prestando serviços durante o procedimento.
Frisa-se, ainda, que os créditos decorrentes de honorários advocatícios, quando submetidos aos efeitos do processo de recuperação judicial, devem ser habilitados na classe trabalhista, a qual tem condições de pagamento menos flexíveis e com prazos diminutos. De modo que, é muito importante mapear previamente os riscos que essa natureza creditícia pode impor à empresa que pretende se valer do processo de recuperação judicial para reorganizar suas finanças.
Em conclusão, o Tema Repetitivo 1051 representa um marco de segurança jurídica para a interpretação do art. 49 da Lei de Recuperação e Falências, fixando critério objetivo para a definição do momento de existência dos créditos — inclusive os de honorários advocatícios. Sob a ótica da empresa em recuperação judicial, a tese reforça a previsibilidade do passivo sujeito à recuperação e contribui para a elaboração de planos mais realistas e exequíveis. Ao delimitar com clareza o que deve ou não ser incluído no quadro de credores, o STJ consolida um entendimento que harmoniza o interesse da preservação da empresa com a proteção dos credores, em consonância com os princípios da função social e da viabilidade econômica do devedor.
Thaís Vilela Oliveira Santos
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