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FIDC’s e o Crédito Submetido ao Processo de Reestruturação Empresarial: Proteção e Possibilidade da Execução Contra Coobrigados
04/12/2024

O mercado de compra e venda de créditos estressados tem ganhado destaque, principalmente devido à simplicidade da sua instrumentalização, realizado por meio de contrato entre as partes, e à rapidez com que é possível captar recursos. Esses créditos, que se originam quando o tomador do crédito deixa de cumprir os pagamentos, podem incluir modalidades diversas, como empréstimos hipotecários, corporativos, de consumo ou dívidas de cartões de crédito.
Nessa operação, os detentores originais desses créditos podem vender as dívidas a terceiros, atraindo investidores interessados. Essa prática beneficia tanto o titular do crédito que não recebeu os pagamentos, como também as empresas que os adquirem, geralmente com um deságio, ou seja, por um valor inferior ao total da dívida original, e disso decorre, inclusive, a remuneração pela aquisição do crédito.
Todavia, com o aumento dos procedimentos para reestruturação empresarial, tais como os pedidos de recuperação judicial e extrajudicial, surgiram desafios significativos. O principal decorre do chamado stay period ou período de suspensão, durante o qual as dívidas submetidas ao processo não podem ser cobradas por outras vias dos agentes econômicos que se encontram no regime de recuperação judicial ou extrajudicial. Assim, para mitigar esse risco, o mercado tem adotado algumas práticas, as quais tem recebido a chancela do judiciário, sendo a principal delas a previsão da cláusula de coobrigação de terceiros pela dívida adquirida.
Para mitigar o risco acima apontado, sugere-se que no instrumento de cessão dos direitos creditórios seja inserida a cláusula de coobrigação. Essa prática permite ao FIDC cobrar os coobrigados — geralmente sócios-administradores — pelos valores inadimplidos. Dessa forma, como a Lei 11.101/2005, que rege o processo de recuperação, obsta que haja a cobrança de crédito submetido à recuperação judicial ou extrajudicial, o FIDC conseguirá perseguir o seu direito de crédito e exigir o seu pagamento do coobrigado.
A Lei 11.101/2005 já chancela essa medida ao prever que o plano de recuperação judicial não produz efeitos em relação ao coobrigado, salvo se o titular do crédito anuir expressamente com essa condição de liberação do devedor solidário ao pagamento da dívida. Recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais de Justiça reforçam essa medida, permitindo ao FIDC seguir com execuções contra coobrigados, ainda que a empresa cedente esteja protegida pelo período de suspensão.
Nesse sentido, oportuno destacar o trecho de uma recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo:
“Assim, o deferimento da recuperação judicial não obsta que o credor promova a cobrança de seu crédito perante os terceiros garantidores, fiadores, avalistas ou coobrigados em geral.
No caso vertente, embora exista no Plano de Recuperação Judicial, pendente de aprovação em assembleia geral de credores, contendo cláusula expressa no sentido de suspender o prosseguimento da execução também em face dos coobrigados (cláusula 5.2 fls. 29/30 destes autos), vale destacar que esta cláusula não deve prevalecer indistintamente a todos os credores, em especial, ao ora agravante, haja vista que para ter efeito ao agravante deve haver concordância expressa deste à mencionada cláusula, o que não ocorreu no caso vertente, sendo certo, outrossim, que até o presente momento, sequer houve a homologação do plano de recuperação judicial.”[1].
As decisões dos Tribunais autorizando a cobrança contra os coobrigados trazem maior previsibilidade ao mercado, especialmente em operações financeiras estruturadas como a venda e compra de créditos estressados.
Com a crescente complexidade das operações financeiras envolvendo empresas em recuperação judicial, a inclusão de cláusulas de coobrigação nos contratos de cessão de créditos surge como uma solução estratégica para FIDCs e investidores. Essa prática, amplamente respaldada pelo Judiciário, oferece maior segurança jurídica e estabilidade ao mercado de créditos estressados.
Nossa equipe de Recuperação de Empresas conta com ampla experiência e profundo conhecimento jurídico para esclarecer todas as dúvidas e oferecer suporte personalizado no uso dos instrumentos de reestruturação da atividade econômica.
[1] TJSP; Apelação Cível 1011752-16.2023.8.26.0011; Relator (a): Thiago de Siqueira; Órgão Julgador: 14ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional XI – Pinheiros – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 19/11/2024; Data de Registro: 19/11/2024
Autores:
Arthur Santos Gonçalves
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Márcia Ferreira Ventosa
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Fernando Castellani
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